É pau, é pedra, é a construção do caminho: o 8 de Março é um dia de luta, recusamos outro desfecho. O 8 de Março é o último dia de campanha eleitoral, queremos as ruas preenchidas por feministas, mas, na mesma medida, por políticas e propostas, recusamos a perda do debate para o susto.
O chão que pisamos é o da crise do custo de vida, da crise da habitação, da diferença salarial, da falência dos serviços públicos, dos reencaminhamentos para aceder à interrupção voluntária da gravidez, da justiça machista, da familiarização dos cuidados e da sobrecarga dos nossos tempos e das nossas vida, conhecemo-lo bem. Conhecem-no melhor as mulheres mais pobres, as mulheres racializadas e migrantes, invisibilizadas no chão que pisam, e limpam todos os dias de madrugada para que as cidades acordem novamente.
Sabemos, contudo, que é este chão que não queremos pisar, e saímos para a rua, no dia 8 de Março, sem concessões e para exigir ao Estado português uma política pública de cuidados – a inscrição dos cuidados na lei enquanto direito universal e gratuito; e para que o direito ao cuidado se cumpra, a criação de um Serviço Nacional de Cuidados que assegure uma rede pública de creches, que não deixe 120 mil crianças sem resposta, uma rede pública de lares, centros de dia e de noite e serviços públicos que garantam cuidados e uma vida autónoma a todas as pessoas ao longo da vida – e o acesso efetivo ao aborto seguro e gratuito, direito conquistado numa luta de décadas, sem reencaminhamentos e bater de portas – exigimos que a objeção de consciência não seja um entrave à aplicação da lei; o fim do período de reflexão obrigatório e um prazo de limite gestacional para interromper a gravidez a pedido da pessoa grávida que se adeque aos tempos e acompanhe o consenso médico e o enquadramento internacional: exigimos as 12 semanas. Sem mestres, nem chefes, dizemos ao Estado português que não somos o útero, nem o colo da sociedade.
Se o 8 de Março é construção de caminho, o espaço de debate e de combate, antes dele, nele e para lá dele, faz-se com um movimento feminista dialogante e alargado, um movimento feminista que acrescenta novos corpos e peles, aqueles que o Estado empurra continuamente para a exaustão e a imobilidade que impede a militância e a luta coletiva, e reafirmamos a greve social como o espaço de alianças e combate a todas as formas de exploração, o espaço feminista anticapitalista que queremos construir.
É pau, é pedra, é a construção do caminho, que não termina, mas que se renova a cada Março.