No final da primeira semana de setembro, reuniu-se na China o Fórum da Cooperação Sino-Africana, com a presença de 53 dos 54 países africanos (ficou de fora eSwatini, a antiga Suazilândia, o único país do continente a reconhecer Taiwan). Nele, Jinping prometeu que nos próximos três anos a China aplicaria cerca de 50 mil milhões de dólares em três anos em África, seja em investimentos diretos (um quinto desse valor) ou em empréstimos e donativos. A pergunta que aqui faço é esta: é a China uma potência imperialista e esta relação com África é parte de um projeto neocolonial?
Uma história de sucesso
A transformação da economia chinesa na fábrica do mundo tem poucas décadas. Foi portanto neste período recente que, mantendo o controlo público sobre o sistema financeiro e as regras para o investimento externo, ao mesmo tempo que aplicou uma elevada taxa de esforço de investimento, de capacitação tecnológica planeada e de acumulação de capital em algumas grandes empresas privadas, a China se tornou uma potência económica. O seu PIB é superior ao dos Estados Unidos em paridades de poder de compra e em breve pode ser maior em termos absolutos (embora, como a população chinesa é cinco vezes maior, o PIB per capita seja muito menor), os seus excedentes comerciais são maiores e a sua capacidade de entesourar reservas é, portanto, superior aos dos seus concorrentes.
Em 2013, o governo chinês lançou uma iniciativa económica e diplomática, a “Nova Rota da Seda”, em analogia com os circuitos comerciais desde os tempos de Marco Polo, só que agora com a direção chinesa. Em 2023 juntaram-se 152 países para comemorar este movimento de capitais e interesses. A reunião de setembro com os países africanos corresponde a um processo paralelo que, como se vê no gráfico, cresceu desde 2000 até tornar a China o principal parceiro comercial de África e, de longe, a principal economia investidora. Ao anunciar os 50 mil milhões, o presidente chinês acrescentou que criariam um milhão de empregos, mas também ouviu dirigentes africanos a contestarem o peso de dívidas anteriores e a pedirem que não se acentuasse a relação desigual. Além disso, como se nota no gráfico, entre 2016 e hoje os empréstimos chineses reduziram-se para cerca de metade em termos de peso no PIB africano, e a verba anunciada é menor do que a dos anos do pico desta relação. Por outro lado, os investimentos concentram-se em alguns países (por ordem, África do Sul, Angola, Nigéria, Congo, Egipto).
Não houve nenhum sinal do alívio da dívida. Esta relação económica subordina, portanto, os países africanos. E, se as infraestruturas criadas são especialmente viradas para a extração mineral (o comércio entre a China e África cresceu em 2023 para 282 mil milhões de dólares), o compromisso destas economias africanas com o rentismo extrativista é a contrapartida da rentabilidade das grandes empresas tecnológicas chinesas. Assim, esta forma de subordinação é uma exploração neocolonial.
Império
A transformação da China numa economia capitalista não tem paralelo com o que se conhece noutros países. Com a queda do regime da URSS, a sua estrutura política desfez-se e, se é verdade que muitos dos beneficiários da razia da pirataria privatizadora, os novos magnates, tinham sido chefes do partido comunista e burocratas regionais ou nacionais, esse trânsito fez-se num novo quadro político, ao tempo encabeçado por Ieltsin. No caso angolano, foi o partido da resistência anticolonial que, chegado ao poder, entregou ao seu presidente e aos seus generais o poder de roubarem os recursos e constituírem as suas fortunas pessoais. Assim, a acumulação de capital procedeu pela ruptura política.
Ora, no caso chinês, há uma continuidade política garantida pela hegemonia do partido comunista. É precisamente a sua burocracia que responde às duas principais formas de criação de uma classe capitalista, uma para a combater e outra para a promover: a corrupção, que é fustigada pelas autoridades dado que impede o seu controlo sobre os mecanismos de formação de fortunas; e a propriedade e direção de empresas que beneficiam das exportações e, crescentemente, do mercado interno. Assim, é um capitalismo tutelado pelo Estado sob uma forma que é historicamente inédita, dada a particularidade de ser um partido comunista que o dirige. Mas é uma economia capitalista e 60% do PIB é gerado por estes setores de acumulação privada, correspondendo provavelmente a três quartos do emprego. A relação com África, que visa obter as importações de energia fóssil e sobretudo de minérios fundamentais para as produções de material de comunicação, é uma componente importante deste mapa.
Ao mesmo tempo, Jinping garante a fidelidade de aliados e, sendo de longe o principal parceiro económico de África, dirige uma rede de alianças que secundariza o papel de Washington neste continente. O imperialismo chinês não se expande criando bases militares ou ocupando território, mas disputa com o centro imperial o domínio sobre uma parte do mundo – e aí tem vencido.