Como Fazer o Futuro do Movimento Climático em Portugal?

No dia 1 de Junho, em Lisboa, realizou-se uma manifestação com o lema “Nós Fazemos o Futuro”, no âmbito de uma convocatória europeia que visava realçar a importância das eleições europeias para o combate à crise climática. Grande parte das medidas de mitigação têm de ser implementadas já de modo a cumprirmos as metas de redução de emissões de gases com efeito de estufa dentro dos prazos definidos pela ciência e, sendo a União Europeia responsável por uma parte muito significativa das emissões globais, os cinco anos do próximo mandato do Parlamento Europeu são decisivos. Isso requer, segundo a convocatória da manifestação, uma transformação da Europa que “só é possível com um movimento popular forte, abrangente e internacional que reivindica um planeta justo e habitável”. Mas como se constrói esse movimento? 

Numa das reuniões preparatórias em que participei enquanto membro da campanha Empregos para o Clima, cada organização apresentou as reivindicações que queria ver representadas e discutidas no âmbito da manifestação, o que resultou numa lista extensa e não totalmente consensual. Partindo dessa lista, as organizações escolheram seis reivindicações que consideraram representativas das suas agendas políticas e consensuais: transição justa imediata, cancelamento da dívida do Sul global; fim dos subsídios aos combustíveis fósseis; fim da publicidade às empresas da indústria fóssil; ultrarricos e empresas poluidoras devem pagar a transição energética; energia renovável como bem público e acessível.  Esta experiência contrasta com a tendência isolacionista no movimento climático, em particular durante a campanha para as últimas eleições legislativas, e é um bom exemplo daquilo que este pode e deve fazer. A urgência do combate às alterações climáticas exige união, não divisão. A criação de um programa comum que várias organizações possam subscrever e com base no qual possam promover acções de mobilização e reivindicação em grande escala é essencial. Ao focar-se nos pontos de discórdia entre as suas várias organizações e ao realizar acções de protesto que prejudicam os trabalhadores a nível pessoal e profissional, o movimento climático ganha a sua antipatia e está, na realidade, a perder tempo precioso. Tempo esse que poderia ser usado numa maior aproximação a esses trabalhadores, com base na ideia de que as suas legítimas aspirações (casa, salário, condições de trabalho, direito ao lazer, ao descanso, à cultura, à saúde, à mobilidade, etc.) não são incompatíveis com a transição energética, mas sim realizáveis através de uma transição justa e de um projecto (ecos)socialista emancipador.

É essa aproximação que a campanha Empregos para o Clima procura fazer. Ao propor a criação de cerca de 200 mil empregos públicos nas áreas das energias renováveis, dos transportes, da construção e da gestão das florestas, dando prioridade à requalificação profissional e recolocação dos trabalhadores que perderão os seus postos de trabalho na indústria dos combustíveis fósseis, a campanha oferece uma solução à classe trabalhadora que não implica o seu sacrifício. A variedade e a quantidade de organizações apoiantes da campanha, entre as quais se incluem associações e colectivos ambientalistas e associações promotoras do comércio justo ou pelo direito à habitação, mas também movimentos de luta contra a precariedade e sindicatos, constituem um potencial de criação de sinergias entre activistas por justiça climática e trabalhadores que não pode ser desperdiçado.

O sector dos transportes é o que mais emite gases com efeito de estufa a nível nacional, sobretudo por via do transporte rodoviário individual movido a combustíveis fósseis. Nesse âmbito, os Empregos para o Clima lançaram recentemente a subcampanha Todos a Bordo, que visa unir activistas, trabalhadores e utentes na luta por mais e melhores transportes públicos, gratuitos e de qualidade, com horários que sirvam as necessidades das pessoas, movidos a electricidade proveniente de fontes de energia renovável, para ligar o país, aumentar a mobilidade e cortar as emissões de GEE. Respeitando e valorizando sempre quem trabalha no sector, através de melhores salários e boas condições de trabalho. A mobilização de utentes dos transportes públicos para a luta climática é também importante, não só porque estes têm interesse em ver a oferta dos serviços reforçada, mas também porque já existem grupos de utentes organizados um pouco por todo o país com o intuito de reivindicar isso mesmo. 

Nas eleições europeias, a direita do PPE (da AD), que financia o capitalismo fóssil em quase 360 mil milhões de euros todos os anos, voltou a vencer e a extrema-direita negacionista das alterações climáticas (veja-se a AfD, na Alemanha) ou com laivos ecofascistas (como o Rassemblement Nacional, em França) cresceu consideravelmente. Só um projecto de justiça social e ecológica capaz de mobilizar as massas da classe trabalhadora poderá virar o jogo a favor da vida, da igualdade e da sustentabilidade. Só um enorme movimento popular terá força suficiente para derrubar o capitalismo e evitar o colapso climático.