O movimento Vida Justa representa uma inovação na mobilização social, que recolhe contributos importantissimos de coletivos negros, socialistas e comunistas, de organização popular. Mobiliza setores sociais frequentemente esquecidos tanto pelos Governo, pela política de direita ma também pelos partidos da esquerda. Esta aprendizagem unitária permitiu-me, até ao momento poder partilhar as seguintes aprendizagens:
A mobilização do sujeito político.
É fundamental definir concretamente quem este é. No caso do Vida Justa são as populações das periferias, o povo suburbano. Esta é um avanço da dicotomia negros vs brancos e permite transformar a organização para servir essa população. É fundamental que o sujeito político detenha o poder na organização e a representa publicamente (evitando paternalismo). É o sujeito político que deve determinar a estrutura da organização e não o oposto. Por exemplo, se pretendemos organizar pessoas que vivem fora do centro da cidade não faz sentido que as reuniões sejam no centro da cidade.
O sectarismo e a desconfiança são a norma numa esquerda fragmentada
Nos tempos que correm não há grandes incentivos ao unitarismo à esquerda. Preservar estes espaços é fundamental, bem como incentivar uma cultura de lealdade onde o movimento é discutido dentro do movimento. Combater o sectarismo dentro dos outros e dentro de nós próprios é uma tarefa importante que precede o restante. A confiança é construída a partir da ação unitária.
É preciso organizar onde as pessoas estão
A proclamação não supera a organização e a criação de confiança só é possível através da presença continuada e do trabalho visível. Este movimento transmite confiança para que as pessoas façam parte também da organização. Para isso é sempre necessário pivots locais que permitem conhecer a fundo os problemas, as tensões locais e o trabalho a fazer para a mobilização política. Por exemplo, são os moradores do Talude os porta-vozes da sua situação concreta.
A comunidade precede a política
Não há organização onde não há comunidade por isso, por vezes, o trabalho da organização começa por ser a criação de comunidade, da intensificação da vida e dos laços sociais que permitem a criação de confiança a partir da qual pode haver política. Este trabalho pode implicar uma dimensão convivial, que convém ser minimamente endógena ao território na qual ocorre. Por exemplo, o grupo local do vj de Sintra organizar semanalmente almoços comunitários que permitem ir fundando essa comunidade. É quase sempre mais fácil convidar para um churrasco comunitário do que para um comício.
O movimento deve de ter linha política e algum modelo de coordenação
A tirania do horizontalismo domina grande parte da ideologia dos movimentos sociais. Mas garantir uma linha política unitária mínima em territórios onde há uma constante aproximação de novos militantes é fundamental para manter alguma coerência no trabalho e para que outra organização não tome o controlo da direção política (os infames golpes).
5.1) Mas isso continua a depender de que haja muita flexibilidade
É crucial enquadrar demandas locais nas gerais do movimento. As reivindicações do Vida Justa eram viradas preferencial para exigência relacionadas como custo de vida: transportes públicos, salários etc. Foi na articulação que se tornou fundamental acrescentar exigência como o fim da brutalidade policial e uma crítica mais contundente ao racismo e à repressão dos imigrantes.
As organizações precisam de foco. Não podem estar em todo o lado a toda a altura
A interseccionalidade como orientação política cria uma difusão organizativa que não permite fazer o trabalho essencial, por vezes. Não se deve ter como princípio a ausência de solidariedade mas é preciso gerir os quadros e a capacidade organizativa conforme os objetivos da organização. Por exemplo, no setor da imigração há muitas organizações (Solim, casa do Brasil etc). Não teria sentido uma organização como a Vida Justa duplicar esse trabalho mas sim reforçar esta problemática e os mecanismos já criados pelos outros movimentos dentro do seu campo de intervenção. A luta social é uma ecologia não uma hierarquia estanque.